E agora, quem toca?

Lembra? Faz tempo que escrevi isso aqui. Faz tempo também que escrevi uma última vez por aqui. O cotidiano atropelou as pausas-para-escrita, e outras pausas, e outras dinamicidades até. Mas, lembra, a última vez que eu vim aqui, contei: a campainha sempre tocava por engano. Era para o vizinho. E era um adulto, sempre um adulto.

Assim, desatento, sem tento?, a contento, apertando o primeiro botão que visse em sua frente. Sem fazer o que pedem às crianças: prestar-atenção, ver-com-os-olhos-e-não-com-as-mãos, ter-calma, entre mais.

O fato de termos duas campainhas lado a lado, mesmo que completamente diferentes, e com instruções completamente distintas também (afinal, a campainha ao lado continha os algarismos 1, 2 e 3, e dizia na placa qual número apertar a depender para onde você quisesse ir; já a minha campainha não continha número nenhum, era só um botão azul), os adultos apertavam continuamente a minha campainha e fazem o que detestam que as crianças lhes façam: atrapalhavam algo muito importante. O algo muito importante era uma criança em psicoterapia.

Nas últimas semanas, parece que cheguei a uma resolução por demais óbvia, a qual eu já deveria ter dado cabo antes: peguei a campainha, puxei um fio bem grande; desci, desci, desci. Pus a campainha assim baixinho, na altura de uma criança de 3-4 anos… E, agora sim, finalmente, o barulho voltou a ser só o que nos interessa. É só o da criança chegando, e ela mesma, péééééim, péim-péim-péim, tocando e chamando para sua vez. Em alguns casos, o contentamento é tanto que elas pedem para tocar na entrada e na saída. Ou tocam tantas vezes. E sorriem, e gargalham. Finalmente podendo fazer, por si, o que sempre precisam do adulto a fazer por elas.

Parece que elas agora chegam mais cheias de si, satisfeitas e orgulhosas do grande feito: tocaram elas mesmas o chamado da psicoterapia. E aguardam. E entram. E não são mais interrompidas por uma não-criança desavisada.

Facebook
Twitter
LinkedIn
Pinterest
Venha conhecer nossa clínica

Agende uma visita